Triste mundo novo

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Há um pequeno castelo no estreito de Ormuz em Omã, que por exemplo, lembra a história nobre de Portugal além-mar. A última marca de uma epopéia cheia de glórias. Agora, a grandiosidade mede-se em barris de petróleo. Um jogo que entrega fortunas a árabes enquanto tira a liberdade a imigrantes pobres. Paquistaneses, indianos, filipinos, nepaleses e sudaneses representam mais de oitenta por cento da população dos Emirados Árabes Unidos.

Triste mundo novo


Na ilusão de uma vida melhor ficam sem passaporte, condenados à escravidão para construir um país que nunca será seu. Meros designers de cidades à escala de um jogo de computador moderno onde apenas interessa ser o maior ou o melhor. É esta visão futurista que nos faz querer perceber a história alimentar de uma das cidades mais jovens do mundo. No avião a caminho do Dubai, encaramos o rosto semi-coberto da jovem que se senta ao nosso lado para perceber se a tradição milenar religiosa se encontra na alimentação. Fala-nos em comida indiana e Burger King. Quando perguntamos por comida local fica atrapalhada, não entende a pergunta.

Não podemos acreditar que a modernidade apagou os vestígios da História. Aterrissamos decididos a desenterrar tradições escondidas. A passagem pelo mercado das especiarias reduz a lista de esperanças. A traça histórica é projetada por madeira oca de memórias e os cheiros sufocam dentro de sacos de plástico cuidadosamente selados. Os restaurantes de comida árabe só servem pratos libaneses, iranianos ou marroquinos. Seguimos diretos para o maior mercado da cidade, em Deira. Há variedade, mas tanto a maioria de produtos como de vendedores é importada. Indianos e paquistaneses garantem o sustento dos vinte por cento de árabes que mandam no país. Nada a fazer. Rendemo-nos às evidências. A cidade cheira a nova.

O Burj Al Arab é o único hotel no mundo com sete estrelas. Cobra ingresso para visitas, mas como marcamos mesa no restaurante panorâmico temos acesso gratuito ao hotel. Num país tão aberto à modernidade, não é de estranhar que o cardápio seja ocidental. Subimos a 200 metros sobre o Golfo Pérsico e entramos curiosos para ver o resultado. Salada niçoise, carpaccio de bife kobe que como o caviar, o foie gras e a trufa branca,– denominação de origem como o champagne da região francesa do mesmo nome – é uma iguaria para poucos. À primeira garfada, o marinheiro de primeira mordida já sente que a extravagância compensa: o bife se desmancha em múltiplos sabores. Graças à intensa marmorização interna – e dizem que a gordura é “do bem” – ela é a mais macia e saborosa das carnes. Lendas cercam o gado Wagyu, de onde ela provém – só bebe cerveja e é massageado ao som de música clássica.

Na sobremesa, tarte de ruibarbo, ( uma planta muito comum nos jardins do norte da América e da Europa onde é cultivado para os seus caules - as folhas são tóxicas - geralmente usados cozidos na confecção de compotas e sobremesas. Tem um sabor delicado e levemente ácido que combina muito bem com coisas doces) com com frutas vermelhas deslumbram pela apresentação. Falta o sabor da história, falta a personalidade de alimentos nacionais... enfim, estrelas a mais!

 


Autor: R.Martins
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Existe 1 comentário para esta publicação
quinta-feira, 7/4/2011 por Elizabeth Winderlyne
Muito triste...
Triste é fugir de suas tradições... Triste é a diferença gritante entre os que podem comer bife do gado wagyu, que se desmancha na boca, e os que nunca experimentaram nem o bife duro da esquina...
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