ACIDENTE NOS TRILHOS

terça-feira, 29 de maio de 2012

A melhor posição que li na imprensa, sobre o recente acidente no Metrô de São Paulo, foi a de Peter L. Alouche, ao compará-lo com o de um moderníssimo avião de passageiros. É uma maravilha tecnológica, até apresentar uma falha. Rogério Centofanti disse-me que, quando de visita ao eng. Peter – e bem antes do acidente – dele ouviu a seguinte analogia, embora sobre a maravilha biológica que somos nós mesmos: vai bem, até ser acometida por um AVC. Os demais correram para os lugares comuns.

ACIDENTE NOS TRILHOS



Repisaram a história da “falha segura”,
como se não tivéssemos aprendido alguma coisa sobre isso no caso do metrô. Não fosse a intervenção do maquinista, e poderíamos estar contabilizando mortes. A “falha segura” não “segurou”. Ao contrário, acelerou.

Não vai aqui nenhuma apologia do homem sobre a máquina, mas a evidente constatação que quanto mais confiamos nossas vidas ao comando das tecnologias, maior é a responsabilidade dos que as produzem e dos que delas fazem uso.

O que não dá para aceitar é o discurso escapista da “fatalidade”. Afinal, a tecnologia é construída por humanos, aplicada por humanos, e cabe a eles, humanos, a constante vigilância sobre elas, de modo que garantam a “segurança” das vidas a ela confiadas. Nessa medida, falha tecnológica é, invariavelmente, uma falha humana.

Não é sem razão que muitas vezes montadoras se utilizam da prática do “recall”. Melhor substituir o que pode gerar problema, do que responder depois, cível e criminalmente, pelas consequências desse problema.

Não pode e não deve ser diferente com os trens metropolitanos e metrô, até mesmo pelo número de vidas que suas composições transportam em apenas uma viagem. Mais do que uma grande quantidade de ônibus, mais do que certa quantidade de aviões, e talvez mais do que um navio de passageiros.

Imagine, no caso do comando humano, o que pode acontecer a quem estiver dentro e fora de um ônibus se o motorista tiver, subitamente, um AVC? Nos trens, sob o comando humano, se o maquinista não acionar de tempo em tempo o dispositivo chamado “homem morto”, para que “em tese” o trem pare?

Nos navios existe toda uma tripulação de “náutica” e, nos aviões, mesmo com toda a tecnologia, um comandante acompanhado de um copiloto. O que teria acontecido com o trem do metrô se lá não estivesse presente o maquinista?

Esse acidente - ainda que uma exceção na história do metrô de São Paulo -, serve ao menos para “esfriar” o conceito de “falha segura”, e colocar a todos na vigilância em torno de medidas que façam da segurança o valor maior de produtores e operadores de trens de passageiros.

Passou da hora, também, de aceitar passivamente a cantilena que se faz acompanhar de falhas e acidentes, que “a circulação foi normalizada”. Ora, a circulação não pode ser interrompida por falhas, e menos ainda por acidentes. Compreensível para obras e reparos, mas não por falhas e acidentes.

O secretário dos Transportes Metropolitanos - como de costume - saiu às pressas para negar defeito no “sistema”. Acostumado a lidar com problemas iguais ou similares na CPTM fez uso do mesmo cachimbo, mas teve que encontrar, no Metrô, equipes voltadas para lidar especificamente com essas emergências, e que não tardaram a apontar problemas técnicos.

O presidente do Metrô veio a público confirmar o problema em equipamento, reconhecer o mérito do maquinista, e abrir sindicância com acompanhamento do sindicato.

Em tudo – como se nota – o tratamento do acidente no Metrô foi diferente de congêneres na CPTM. O do metrô mereceu até a presença rápida do Ministério Público e de famoso delegado de polícia, “novidades” desconhecidas nos da CPTM.

As diferenças de tratamento são nítidas, e ninguém me tira da cabeça que isso se deve exclusivamente às diferenças dos públicos servidos pelas duas operadoras.  No Metrô todo mundo quer aparecer na “fita”, enquanto na CPTM todo mundo quer sair de cena.

Definitivamente, o Estado está se lixando para os “suburbanos”.


Autor: Éverson Paulo dos Santos Craveiro
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