Quem é Aécio, o homem que ameaça a “presidenta”?‏

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Essa matéria foi publicada na edição de ontem do jornal português Expresso Diário. Tive o cuidado de transformá-la em Word e reeditá-la para mostrar uma visão desapaixonada da imprensa internacional mostrando Aécio Neves como ele é, destacando prós e contras da sua candidatura e, principalmente, expondo as dificuldades que ele poderá encontrar durante a campanha do segundo turno, considerando que ele tem, assim como a “presidenta” Dilma, o que os portugueses chamam de “queixo de vidro”. Com vocês; Aécio Neves!(Celso Mathias)

Quem é Aécio, o homem que ameaça a “presidenta”?‏

Na sua longa carreira política, o homem que desafia Dilma Rousseff só perdeu uma eleição. É o preferido dos mercados, mas tem fragilidades.

Contados os votos, a segunda volta da eleição presidencial brasileira vai ser o costume: PT contra PSDB. Mas vai ser, também, imprevisível. Dilma Rousseff é favorita, segundo os estudos de opinião, mas a sua própria candidatura previu, esta tarde (manhã no Brasil), que Aécio Neves possa ultrapassá-la nas primeiras sondagens para o tira-teimas, segundo o jornal "Folha de São Paulo”.

O homem que as sondagens chegaram a dar como liquidado ressurgiu para desfiar a "Presidenta". Amante do surf e da equitação, cavalgou a crista da onda e neutralizou Marina Silva, que ficou com 21,32%, face aos 33,55°/0 de Aécio e aos 41,59% de Dilma.

Será este político curtido de 54 anos ameaça real para Dilma, que governa há quatro anos? Aécio tem sangue de político nas veias e só perdeu, até à data, uma eleição. Foi em 1992, para prefeito da sua terra natal, Belo Horizonte (onde também nasceu a Presidente). Desde então, foi só vencer.

Sondagens sobre a segunda volta feitas antes da primeira volta davam a vitória a Dilma, mas o resultado de ontem e o posicionamento dos nove candidatos eliminados podem alterar tudo.

Por ironia, no próximo dia 26 grande parte do destino de Aécio dependerá do que disser Marina Silva, a vítima principal dos seus ataques na reta final da campanha para a primeira volta. A candidata do Partido Socialista Brasileiro é politicamente mais próxima do Partido dos Trabalhadores, onde já militou (foi ministra do Ambiente de Lula), mas saiu zangada e tem sido forte crítica de Dilma. Ontem falou de "vontade de mudança" do eleitorado. Daí a apoiar Aécio vai um passo largo, mas já é qualquer coisa. O coordenador de campanha de Marina considera "difícil" que prefira Dilma.

Aécio não se coibiu de elogiar, na noite eleitoral, Eduardo Campos, o candidato cuja morte num acidente de aviação catapultou Marina Silva (sua vice) para a ribalta.

Para vencer (diz a imprensa brasileira) Aécio terá de saber falar ao povo. O seu Partido da Social Democracia Brasileira é muito associado às classes privilegiadas e o próprio Aécio vem de família abastada. Conquistar os brasileiros mais pobres não é o mesmo que convencer os mercados (esses acordaram em alta) felizes por a escolha não ser entre Marina e Dilma). Expressões como "previsibilidade" ou "choque de gestão" agradam aos investidores mas não falam ao coração do eleitor.

POLITICA DESDE O BERÇO

Quando foi eleito deputado federal, em 1986, Aécio Neves representava a terceira geração da família paterna na Câmara brasileira, depois do pai, Aécio Cunha, e do avô, Tristão Ferreira da Cunha. Mais famoso é o avô materno, Tancredo Neves, que foi eleito presidente em 1985 (pelo parlamento, ainda antes das eleições por sufrágio universal) mas morreu antes de tomar posse.

Foi Tancredo que levou o neto para a política, arrancando ao Rio de Janeiro, para onde fora viver com os pais aos 10 anos, por ocasião da sua candidatura a governador do Estado de Minas Gerais, bastião da família. O neto, cujo primeiro emprego fora no Ministério da Justiça do Estado carioca, tornou-se secretário pessoal do avô aos 21 anos. Na campanha deste ano, Aécio não se inibiu de puxar dos galões genéticos, tendo até publicado uma foto de Tancredo no Facebook, na véspera da eleição.

Eleito governador de Minas em 1981, Tancredo levou Aécio a países democráticos - coisa que o Brasil queria ser mas ainda não era -) o que lhe permitiu conhecer Reagan, Mitterrand, Craxi ou o rei Juan Carlos.

Já formado em Economia pela Universidade Católica, trabalhou na campanha presidencial sufrágio universal para a presidência. Quando Tancredo morreu, em vez de um quase certo lugar no gabinete presidencial, Aécio foi para a Caixa Económica Federal (banco público). Tinha 25 anos e, no ano seguinte, seria deputado federal. Cumpriu quatro mandatos e, entre as causas que defendeu com êxito, esteve o direito ao voto aos 16 anos, o fim da imunidade parlamentar para delitos comuns e a disponibilização dos processos legislativos na Internet. Entre 2001 e 2002 foi presidente da Câmara dos Deputados, eleito contra quatro candidatos e somando mais votos que todos eles juntos.

VITÓRI AS QUE BATERAM RECORDES

Aécio promete "um governo de previsibilidade, para resgatar a credibilidade”. "Não vai ter surpresa alguma", jura. Pretende colher louros da governação do Estado de Minas Gerais" que exerceu entre 2002 e 2010 e que levou John Briscoe, então diretor do Banco Mundial para o Brasil, a dizer que (Os primeiros resultados foram espetaculares e todos em Washington ficaram bem impressionados".

Com o apoio de nove partidos, Aécio foi o primeiro governador de Minas eleito à primeira volta (57,68%, a maior votação no Estado até então). Extinguiu muitos cargos de confiança política, reduziu o seu próprio salário e equilibrou as contas de um Estado endividado em 5000 milhões de reais (1600 milhões de euros). Não o fez estrangulando a economia, mas lançando projetos como a nova Cidade Administrativa Tancredo Neves (2010), para albergar a sede do governo estadual, projetada por Oscar Niemeyer. Minas foi o primeiro estado do Brasil a colocar as crianças de seis anos de idade na escola, ampliando em um ano o ensino público. Uma avaliação do Governo federal (do PI) considerou que o Estado tinha a melhor educação básica do Brasil. Aécio lançou, também, um Projeto de Combate à Pobreza Rural. Reeleito em 2006 por uma aliança de dez partidos, obteve 73,03% dos votos. Deixou o cargo em 2010, com 90% de aprovação, embora contestado por sindicatos como o dos professores.

Aécio acalentou esperanças de ser o candidato do PSDB à presidência em 2010, mas José Serra, que perdera para Lula em 2002 e era o líder efetivo do partido, resolveu voltar às lides. Segundo a revista "Época", chegou-se a pôr a hipótese de Aécio concorrer com o apoio de Lula e do PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro), do atual vice- presidente Michel Temer –(a força política nunca teve um Presidente da República) mas foi sempre um "fazedor de reis" -, mas Aécio não quis sair do PSDB. Preferiu lançar-se na corrida ao Senado, deixando como governador em Minas o seu vice, Antônio Anastasia. Granjeou 7,5 milhões de votos, tornando-se o senador mais votado do seu Estado, e foi para Brasília com o ex- Presidente Itamar Franco, também senador mineiro. Prometendo basear a oposição a Dilma em três pilares - (coragem, responsabilidade e ética" -) fez um discurso sobre o que considerava ser os 13 fracassos do governo do PT sob Lula.

POLIR OS TELHADOS DE VIDRO

Além da imagem de playboy endinheirado, Aécio tem outros pontos fracos. Foi acusado - sem confirmação - de consumir cocaína) e, em 2011, recusou-se a fazer um teste de alcoolemia. Tentou censurar órgãos de' comunicação e até motores de busca da Internet (Google, Yahoo e Bing), em reação a notícias menos lisonjeiras, e instigou a demissão de um diretor da Globo em Minas Gerais. A revista "Piauí" escreveu, em tom de gozo) que seria capaz de processar as empresas de sondagens por lhe anteverem o terceiro lugar.

Essa questão, pelo menos, ficou resolvida ontem à noite. Apesar do currículo de boas contas que gosta de apregoar, Aécio foi julgado e absolvido pelo desvio de 4300 milhões de reais (1400) de dinheiros públicos do setor da saúde. Não caiu bem a construção de cinco aeroportos em povoações com menos de 25 mil habitantes-todos perto de propriedades suas e um na fazenda de um tio.. Também terá expropriado um terreno a um tio-avô, pagando (o Estado) 20 milhões de reais por uma parcela avaliada em um milhão.

Na contagem decrescente para a segunda volta, Aécio - que o PSDB selecionou para candidato presidencial em 2013, sob o incentivo do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso - espera que tudo isto pese menos do que a dívida crescente do Brasil, o crescimento econômico comparativamente débil (2)3% em 2013, contra 7)5% em 2010) e o escândalo de corrupção da petrolífera estatal Petrobras. Fala em recuperar a credibilidade financeira, reduzir o número de ministérios e levar para a escala nacional políticas testadas com êxito em Minas Gerais. Já tem ministro das Finanças) caso ganhe: Armínio Fraga, formado em Princeton e ex-presidente da bolsa de valores.

Para alimentar a imagem de homem respeitável e esconjurar fantasmas do passado, Aécio deu em publicar nas redes sociais, e até no YouTube, imagens e vídeos da sua família. Casado com a ex-modelo Letícia Weber,(foto) de 35 anos, foi pai dos gémeos Júlia e Bernardo em junho último e batizou-os em plena campanha eleitoral. Da primeira mulher (Andrea Leite), tem uma filha de 23 anos) Gabriela.

Questionado sobre o aumento do seu rendimento declarado de 617 mil reais em 2010 para 2,4 milhões em 2014 (de 203 mil para 791 mil euros), explicou que herdara dinheiro do pai, falecido há quatro anos. Se vier a ser Presidente do Brasil, essa não terá sido a herança mais importante que os antepassados lhe deixaram.


Autor: Pedro Cordeiro
Publicação vista 2128 vezes


Existe 0 comentário para esta publicação
Enviar comentário


Confira na mesma editoria:
Bolsonaro pode ser uma espécie de macaco sujo de óleo que tira o carro do buraco
Bolsonaro pode ser uma espécie de macaco sujo de óleo que tira o carro do buraco
O que há de verdade na “Carta Aberta ao senador Renan Calheiros”
O que há de verdade na “Carta Aberta ao senador Renan Calheiros”
Copyright 2014 ® Todos os Direitos Reservados.