O turbilhão de liberdade sexual e corrupção oficial foi controlado por uma poderosa Máfia até o dia em que Fidel Castro desceu de Sierra Maestra e acabou com a festa.
Pelo palco do Tropicana passavam os artistas mais famosos da época, entre eles a brasileira Carmen Miranda. Entrevistada pelos jornais cubanos da época ela falava de sua origem portuguesa e que fora levada ainda menina para o Brasil, onde se revelou-se no show business em 1934 com o sucesso estrondoso de um filme carnavalesco, ‘Alô, alô, Brasil’.
O Tropicana viveu seus melhores momentos com Carmen cantando e dançando, às vezes descalça e com a barriga de fora, sob luzes feéricas e o ritmo alucinado do carnaval carioca. Em Cuba, onde foi aguardada com ansiedade por muito tempo, ela falava espanhol com absoluta fluência e debochava do tamanho da própria boca ressaltado por quantidades industriais de maquiagem. Carmen encantou corações e mentes cubanos, que receberam com desolação a notícia de sua morte prematura em 1955, vítima de um ataque cardíaco.
Não muito depois a revolução cubana triunfaria, o ditador Fulgêncio Batista seria despachado para o exílio e o Tropicana passaria a ser administrado por um interventor conhecido simplesmente como Rodobaldo. O agente do regime tomou posse vestindo um uniforme verde-oliva que se chocava com o espírito de uma casa onde também haviam atuado Nat King Cole, Josephine, Sarah Vaughan.
Apoiados no bar, alguns frequentadores habituais do Tropicana falavam em sussurros, a uma distância prudente de Rodobaldo sentado num banquinho olhando para todos com cara de poucos amigos. Uma noite, a uma certa altura uma porta se abriu e entrou saltitando o pianista Felo Berganza.
Conhecido por seus trejeitos e suas piadas, Berganza era um mulato simpático, com lábios grossos, que aparecia na metade do show, sob aplausos, tocando um piano com cauda branca. “Tatachán”, continuou com sua coreografia, brincando de mesa em mesa até cair ao lado de Rodobaldo. “Companheiro!”, exclamou o comissário insultado. Felito Berganza ergueu as sobrancelhas e exagerou ainda mais o gesto, entre gargalhadas gerais.
“Não me diga que você também é uma bicha”, perguntou ao sisudo revolucionário.
Com esta anedota, contada pelo músico Paquito De Rivera, chegaram ao fim os 20 anos de capitalismo do Tropicana e começou a larga travessia socialista de um dos cabarés mais famosos do mundo, de prestígio comparável ao Moulin Rouge e do Lido de Paris.
O primeiro nome do Tropicana foi Beau Site e seu promotor foi o empresário ítalo-brasileiro Víctor Correa, que inaugurou o cabaré na noite de 31 de dezembro de 1939 nos terrenos arrendados de Villa Mina, uma imponente propriedade suburbana na zona de Mariano com palmeiras fabulosas e grandes árvores tropicais. Correa era casado com Teresa de España, artista de cuplé que protagonizou o primeiro espetáculo com o acompanhamento da orquestra de Alfredo Brito, autor das estrofes que um ano depois dariam nome ao cabaré – “Tropicana/ diosa de amor/ eres tú, mi bien/ la que inspiró mi canción” – e com as quais, desde então, todos os espetáculos começariam.
Desde o começo, Tropicana foi um sucesso. A incrível vegetação tropical inserida no contexto arquitetônico do salão, aberto às estrelas, somava a beleza das suas bailarinas (“o melhor das mulatas cubanas”, segundo a imprensa da época) à qualidade da orquestra e dos shows. Em abril de 1941, Congo Pantera estreou e, a partir deste momento, sua consagração foi absoluta. O show evocava a caça de uma pantera nas selvas africanas e a coreografia era de David Lichine, dos famosos balés russos de Montecarlo.
Durante o espetáculo, os bailarinos surgiam de dentro de uma folhagem iluminada, e a pantera – a bailarina russa Tatiana Leskova – descia ao cenário de uma árvore, perseguida pelo caçador-percussionista Chano Pozo, que depois daria forma ao jazz afro-cubano com Dizzy Gillespie. Os jesuítas do Colégio de Belém, do qual Fidel Castro era ex-aluno, pressionaram sem sucesso para o cabaré ser fechado. O Tropicana já tinha se convertido numa selva com Chano e Mongo Santamaría fazendo soar seus tambores pelas árvores.
O Tropicana viveu todas as fases da revolução, a invasão da Bahia dos Porcos, a Crise dos Mísseis, o êxodo de Mariel e a queda do Muro de Berlim. Sobreviveu à crise e à ideologia, e hoje os espetáculos que oferece, com suas 50 bailarinas, 40 modelos, 11 cantores e 25 músicos, continuam sendo referências mundiais. Por volta de 150.000 turistas visitam o Tropicana todos os anos, mas agora seus gerentes esperam que os norte-americanos retornem, se as tensões com os Estados Unidos forem reduzidas, e as relações, restabelecidas. O espírito de Carmen Miranda retorna, enquanto o do “coletivo Tropicana” desapareceu.